Introdução
Em escoamentos de fluidos, é comum a necessidade de considerar a perda de carga através de algum componente específico. Por vezes, esses componentes apresentam detalhes geométricos complexos ou muito pequenos, que podem dificultar a geração de malha, aumentando a contagem de elementos e tornando proibitivo o tamanho da simulação. Alguns exemplos de aplicações com essas características são:
- Placas perfuradas;
- Grelhas/Venezianas;
- Filtros/peneiras;
- Bancos de tubos ou aletas;
- Meios porosos em geral;
No Fluent, é possível caracterizar o comportamento desse tipo de componente como uma membrana (“Porous Jump”) ou meio poroso (“Porous Media”), dependendo se é desejado considerar a espessura do mesmo ou não. Notar que essa abordagem tem como limitação o fato do bloqueio físico pelo sólido não ser modelado fisicamente, usando o conceito de velocidade superficial.
Importante ressaltar que é necessário modelar o meio poroso como um domínio à parte, ou seja, a região do meio poroso deve representar uma cell zone de forma separada de onde o fluido escoa livremente. Da mesma forma, o “Porous Jump” também deve ser identificado como uma superfície na geometria.
Modelo matemático de meio poroso
O modelo de meios porosos segue a lei de Darcy, juntamente com um termo inercial, resultando em modelo também conhecido como de Darcy-Forchheimer.
O primeiro termo do lado direito da equação representa a perda viscosa, proporcional à velocidade, enquanto o segundo termo representa a perda inercial, proporcional ao quadrado da velocidade.
Num problema com modelo de meios porosos, tem-se por objetivo representar a mesma resistência ao escoamento, isto é, a mesma perda de carga do cenário com a geometria real. Para atingir este resultado, é necessário ajustar os coeficientes D e C. Destaca-se que, em alguns casos, D e C podem assumir valores diferentes para cada direção do escoamento.
Para um cenário com meio poroso homogêneo, e sendo D o inverso da permeabilidade (α), a equação pode ser escrita como:
Ajuste dos coeficientes de meio poroso
O ajuste dos coeficientes é feito da seguinte forma:
- Ajustamos os pontos usando polinômio de primeiro ou segundo grau (verificar o melhor ajuste - placas perfuradas ou bancos de tubos podem se ajustar melhor a um modelo sem o termo viscoso, por exemplo);
- A variável independente (abscissa) deve ser a velocidade;
- A curva deve cruzar a origem (0,0), logo o polinômio será do tipo P = av²+bv;
- Evitar extrapolação para velocidades fora dos dados disponíveis
- A viscosidade e a densidade do fluido devem ser conhecidas. Para um meio poroso, a espessura também deve ser considerada para a determinação dos coeficientes;
- Os coeficientes são determinados por similaridade das equações. Notar que Si é a queda de pressão por unidade de comprimento. Se wi é a espessura do meio, a equação pode ser reescrita da seguinte maneira aproximada:
- Desta forma, para uma direção específica, podemos determinar os inputs necessários no Fluent:
Que no Ansys Fluent são inseridos na aba Porous Zone, nos respectivos campos conforme imagem abaixo:
Figura 1 – Campos para preenchimento de resistências inerciais e viscosas no Ansys Fluent
Para um meio fortemente anisotrópico, usar a opção “Alternative Formulation” pode trazer maior estabilidade aos cálculos. Com ela, o cálculo da perda de carga na direção i usará apenas a magnitude da velocidade nessa direção (ao invés da velocidade total).
É importante perceber que as direções devem ser especificadas de forma cuidadosa para que reflitam as condições do escoamento. Essas direções são inseridas através de vetores ainda na seção de meio poroso.
Figura 2 – Campos para preenchimento das direções especificadas no Ansys Fluent
Um escoamento através de placas paralelas, por exemplo, restringe a passagem do fluido em uma das direções perpendiculares. Assim, os coeficientes nessa direção devem assumir valor diferente das demais. Na prática, atribuir valores maiores em algumas ordens de grandeza na direção na qual o escoamento é mais restrito é o suficiente para considerar esse tipo de efeito.
Porous Jump
Finalmente, para caracterização de uma membrana porosa (“Porous Jump”) usam-se as mesmas considerações anteriores, com a simplificação de que a velocidade sempre será a normal à superfície – logo, não há direções a ser especificada. Esta simplificação a torna uma solução mais estável, sendo preferível adotá-la sobre o meio poroso, quando aplicável.
Atenção: Aqui também é exigido que insira a informação da permeabilidade do meio, e não o inverso dela. Além disso, a espessura do elemento real também deve ser informada, pois a superfície que recebe a condição de “Porous Jump” efetivamente é uma aproximação por uma superfície sem espessura.
Figura 3 - Interface para caracterizar Porous Jump no Ansys Fluent
Planilha para cálculo
A planilha em anexo ao final deste artigo permite o ajuste conforme discutido na seção anterior.
Deve se preencher apenas campos em laranja. Os valores a serem usados no Fluent são calculados automaticamente na região em amarelo. Para uso, seguir os passos abaixo:
- Inserir os dados do fluido de densidade e viscosidade, bem como a espessura do meio;
- Inserir os dados de pressão x velocidade. Se dispor apenas de dado de vazão, convertê-la em velocidade;
- A curva no gráfico já ajusta os pontos a um polinômio de segundo grau, passando pela origem. Os coeficientes do polinômio devem ser inseridos na parte inferior da planilha.
Exemplo de uso da planilha de ajuste dos coeficientes
No exemplo de sistema de admissão de ar abaixo temos um componente (filtro) que deve ser modelado como meio poroso. A espessura do filtro é de 45 mm.
Este filtro foi sujeito a teste em laboratório e, para diferentes velocidades de ensaio, observaram-se os seguintes valores de perda de pressão:
velocidade (m/s) | Δp (Pa) |
2,07 | 133 |
3,1 | 249 |
4,15 | 390 |
5,18 | 598 |
6,22 | 797 |
Para o ar incompressível, temos as propriedades na aba Materials: ρ = 1,225 kg/m³ e μ=1,7894e-5 Pa.s
Caso as propriedades dependam de valores de pressão/temperatura, por exemplo, elas podem ser estimadas inicializando o problema e, na sequência, utilizando os campos das propriedades.
Preenchendo as propriedades e os dados de perda de pressão na planilha, o gráfico é atualizado, e uma linha de tendência é ajustada.
Os coeficientes do polinômio devem ser inseridos na parte inferior da planilha, tal que os valores a serem utilizados no Fluent são mostrados na seção em amarelo (são calculados a partir dos coeficientes e das propriedades).
Como visto anteriormente, esses valores devem ser inseridos na aba Porous Zone (sob Cell Zone Conditions).
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